Mariana Versolato
Natalia Abramides
1 Introdução
A sensação de que o tempo está passando cada vez mais rápido e de que, por outro lado, as distâncias estão se encurtando é sintoma da “sociedade da informação”, expressão cunhada por Manuel Castells. O advento das Internet certamente se configura como uma das mais importantes ferramentas para que as comunicações tenham assumido o presente caráter global, permitindo que o mundo se tornasse acessível a partir de um click.
A Internet, como espaço ilimitado de dados, também tornou possível a conexão entre diversas informações a partir da disponibilização de um arquivo imediato e global. O hipertexto, como fragmentador do discurso, é a chave do dinamismo e do mosaico de infindas possibilidades do universo da web, já indissociável das atividades e ate mesmo das relações humanas na era da globalização.
2 A Internet e a ampliação da comunicação hipertextual
Afirma-se que a web inaugurou uma nova forma de escrita; a notícia, por sua vez, ao se constituir em uma narrativa, também ganharia novos contornos no webjornalismo. Contudo, as características desse novo formato não são tão inéditas como afirmam com tanta certeza alguns pesquisadores da comunicação na rede.
Beatriz Ribas, pesquisadora em jornalismo On-line da UFBA, elenca como características da notícia na web hipertextualidade, interatividade, multimidialidade, personalização, memória e atualização contínua. Tal constatação corresponde, de fato, aos padrões encontrados na webmídia; entretanto, as peculiaridades apontadas pela pesquisadora não são exclusivas do meio de comunicação em questão, mas apenas tiveram suas possibilidades ampliadas pela Internet.
Levando-se em conta a primeira das características, Lévy define o hipertexto como "um conjunto de nós ligados por conexões" (apud AQUINO), configurando-se, assim, em uma trilha de associações por meio de links percorrida pelo leitor. Dessa forma, o hipertexto traz em si a interatividade, ao permitir que o internauta trilhe seu próprio caminho bem como crie novas alternativas. Mas a hipertextualidade já estava, de certa forma, presente na Idade Média, quando os comentários dos leitores eram anotados às margens dos textos.
A noção de hipertexto, contudo, surgiu somente em 1945, a partir da idéia de Vannevar Bush (responsável por uma Agência de Desenvolvimento e Pesquisa Científica do Governo norte-americano) em organizar uma grande quantidade de dados de forma a possibilitar, por trilhas associativas, uma consulta veloz e eficiente por parte dos pesquisadores. Já no ano de 1965 - mesmo ano em que surgiu o primeiro computador comercial - Ted Nelson cunhou o termo "hipertexto", que serviria como estrutura de seu Projeto Xanadu - uma biblioteca universal ao alcance de todos. Finalmente, o sistema World Wild Web surgiu em 1989, a partir do trabalho de Tim Berners-Lee, possibilitando a máxima efetivação do hipertexto.
A narrativa hipertextual - e não apenas porque remonte à Idade Média - está intrinsecamente ligada ao ser humano. O cérebro humano organiza as informações por meio de associações, bem como ocorre na estrutura do hipertexto. Assim, o ser humano cria categorias para os eventos e os armazena em sua memória, de forma que uma palavra, um gesto ou um sinal podem trazer à tona recordações a eles relacionadas, bem como os mecanismos de busca na web. Mas Canavilhas ressalta uma importante diferença entre tais estruturas: enquanto o ser humano guarda um fato ocorrido como recordação do passado em sua memória, todos os fatos na Internet compartilham da mesma natureza, constituindo-se em um presente contínuo.
3 Webjornalismo e memória coletiva
O registro e a criação de uma memória coletiva foram ampliadas com a Internet, que possibilitou o armazenamento e a associação de um grande número de informações. Assim, o indivíduo que cria um novo caminho na rede (seja por meio de um blog, de um link inserido em um fórum de discussões, pela alteração de informações em um site etc) contribui também para formação da memória coletiva. Conforme expõe Canavilhas:
O recurso de um indivíduo às recordações de outros faz com que a memória individual seja, também, uma memória colectiva na medida em que se alicerça num conjunto de memórias que passam de geração e geração, sendo compartilhadas por vários indivíduos que tomam contacto com elas através da escrita ou da oralidade.
Nesse sentido, o jornalista também atua como formador da memória coletiva, ao inserir regularmente novos fatos à memória da web. O referido "presente contínuo" e a necessidade de uma atualização em tempo real das notícias expõem o webjornalismo ao perigo de se tornar superficial e descontextualizado, distorcendo, assim, a memória em questão. A partir dessa observação, faz necessária a reflexão acerca do papel desempenhado pelo jornalista dentro de um sistema que prima, na maioria das vezes, pela velocidade e quantidade em detrimento da precisão e qualidade, além de um fator crucial: o jornalista deixa de ter exclusividade da posição de emissor de informações, tendo em vista a interatividade e a fragmentação no discurso propiciadas pela Internet.
Por outro lado, a Internet, ao comprimir as barreiras de tempo e espaço, contribui para uma maior contextualização no jornalismo na medida em que representa a possibilidade de acesso imediato a informação. Segundo Canavilhas, a contextualização assume particular importância, pois a natureza hipertextual da Internet permite o enriquecimento das notícias, contrariando um dos maiores problemas do jornalismo atual: a compatibilização da velocidade da informação com o espaço disponível e com a riqueza das informações.
Assim, a Internet se distingue dos outros media, por possuir uma base de dados que permite, por sistemas de buscas, um manejo de informação impensável em um meio convencional. Luis Nogueira (apud CANAVILHAS) atesta que a grande vantagem da Internet é sua capacidade de indexação, aliada ao poder de informação que torna toda informação virtualmente imediata: “Se antes o destino do trabalho jornalístico se jogava ao nível do efêmero [...], agora a informação entrou no regime do presente continuo potencial”. Canavilhas ainda afirma que, no atual panorama, a notícia perde sua natureza perecível, ganha novas propriedades e passa a constituir uma unidade de memória.
Para Ribas, o banco de dados na web se configura como o centro de processo criativo, além de suporte para a composição de novos modelos de narrativas multimídia. Estas estão geralmente associadas ao conceito de interatividade, pois, segundo o autor, “a narrativa interativa é constituída por um numero de registros de banco de dados conectados de modo que mais de uma trajetória é possível”.
No webjornalismo, tal interatividade não é absoluta: alguns sites se contentam meramente em reproduzir o conteúdo de seu veículo impresso para a Internet, adotando o modelo linear de narrativa, conforme classifica Aquino. Um modelo mais adequado a proporcionar a interatividade, ainda segundo Aquino, seria o hipertextual, que contaria com links, chats, enquetes e mesmo vídeos, proporcionando ao leitor diversas opções de associação e trilhas. Primo (apud AQUINO) classifica o hipertexto em potencial – em que os caminhos estão pré-determinados pelo programador da página – colagem – que permite uma maior criação por parte do internauta – e cooperativo, construído através do debate entre o autor e o usuário da pagina.
Nesse sentido, Aquino expõe que a Web 2.0, baseada na cooperação, representa a real possibilidade de interação, ao quebrar os conceitos de "emissor" e "receptor" e propiciar uma escrita coletiva na web. Seu maior exemplo de uso efetivo do hipertexto cooperativo e da interação mutua está na Wikipédia, que permite a livre alteração de seu conteúdo por parte dos usuários e, assim, contribui para a construção da coletividade na Web.
4 Considerações finais
As transformações advindas dos progressos tecnológicos, especialmente relacionadas aos meios de comunicação, provocaram mudanças profundas nas relações humanas de modo que, muitas das atividades até pouco tempo realizadas sem as beneficies da Internet, hoje são praticamente indissociáveis desta. No panorama atual, a idéia de um novo cenário em que a informação assume um caráter multilateral, livre e interativo parece cada vez mais perto de se concretizar. Desse modo, a crença de Levy (apud AQUINO) na criação de um imaginário coletivo em que as pessoas teriam acesso a uma maior quantidade de informações e de conhecimento também assume feições mais reais.
Entretanto, Aquino afirma que hoje ainda prevalece a unilateralidade na criação dos links, a interação muitas vezes permanece reativa e o hipertexto se desloca entre potencial e colagem. A autora afirma que “é preciso atentar para o exagero na crença do potencial coletivo da web”, pois a concretização de um hipertexto coletivo é viável e necessária, mas não deve ser aplicado a todas as paginas. Além disso, acredita que a Internet, por maior abrangência que venha a ter, será apenas mais uma forma de comunicar.
Tendo em vista as inúmeras possibilidades oferecidas pela Web e as constantes mudanças nas comunicações e no webjornalismo, Ribas ressalta que se faz necessário atentar para as especificidades do meio e suas potencialidades para elaborar estratégias de persuasão e construções criativas de narrativa de modo a criar uma gramática própria para o webjornalismo.
Referências:
AQUINO, Maria Clara. Um resgate histórico do hipertexto. Disponível em: <http://www.facom.ufba.br/ciberpesquisa/404nOtF0und/404_55.htm>. Acesso em: 07 mai. 2007.
CANAVILHAS, João Messias. A Internet como memória. Disponível em: <http://www.bocc.ubi.pt/pag/canavilhas-joao-internet-como-memoria.html >. Acesso em: 07 mai. 2007
RIBAS, Beatriz. Características da notícia na Web - considerações sobre modelos narrativos. Disponível em: <www.facom.ufba.br/jol/pdf/2004_ribas_caracteristicas_noticia_web.pdf >. Acesso em: 07 mai. 2007
SANTOS, Sandra. O Livro e o Computador: Viagens por Labirintos de Palavras. Disponível em: <http://www.uc.pt/diglit/DigLit%20Ensaios/Ensaios%202003-2004/Ensaio05.htm > . Acesso em: 07 mai. 2007
sexta-feira, 6 de julho de 2007
NAS TRILHAS DO HIPERTEXTO
Postado por natalia às 18:48
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